Selic baixa só no fim do novo governo

Se os juros dos títulos vendidos pelo Tesouro Nacional forem um bom parâmetro para estimar o comportamento da Selic, a expectativa é de que apenas depois de junho de 2018 a taxa básica cairá para menos de 12% ao ano.

No leilão mais recente, as Letras do Tesouro Nacional (LTN) com vencimento em abril de 2015, outubro de 2016 e julho de 2018 foram vendidas com taxas médias de 11,68% ao ano, 12,36% ao ano e 12,42% ao ano, respectivamente. Os papéis têm juros prefixados.

No dia 10 de julho deste ano, as mesmas LTNs tinham sido vendidas com taxas de 10,90% ao ano, 11,52% ao ano e 11,92% ao ano, para os mesmos vencimentos.

O gráfico abaixo compara a estimativa da taxa Selic em 10 de julho e em 30 de novembro, considerando a diferença de taxas entre os três vencimentos de LTNs. Os cálculos levam em conta a quantidade de dias úteis em cada período.

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Em 10 de julho a Selic estava em 11% ao ano. A expectativa era de que permaneceria estável até março de 2015, conforme indica a primeira barra azul do gráfico. O ganho da LTN com vencimento em 1° de abril de 2015 seria de 10,90% ao ano.

Agora, a primeira barra vermelha do gráfico mostra que é possível a taxa básica atingir 12% ao ano até março de 2015. Como a Selic atual é de 11,25% ao ano, o aumento dos juros seria tal que, na média do período, a taxa ficaria em 11,68% ao ano.

No intervalo entre abril de 2015 e setembro de 2016, a estimativa em julho era de que a Selic ficasse, na média, em 11,83% ao ano. Agora, a previsão é de taxa média de 12,55% ao ano.

Não houve mudanças significativas para o período entre outubro de 2016 e junho de 2018. Em julho a estimativa era de 12,46% ao ano e agora é de 12,51% ao ano.

Na teoria, se a ação do Banco Central (BC) for eficiente para controlar a inflação, a tendência é de redução dos juros no futuro. Portanto, no mundo ideal do BC, as estimativas para a taxa Selic serão menores nas datas mais distantes.

Hoje, no entanto, mesmo considerando que os papéis de prazo mais longo possuem um prêmio de risco, as expectativas são de taxas significativamente maiores no futuro. Ainda faltam novas sinalizações da equipe econômica para ancorar as expectativas.

Volta ao trabalho

A decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central de aumentar a taxa Selic surpreendeu e sinaliza a urgência para a adoção de medidas concretas na área econômica.

Ficou mais evidente que não basta apenas indicar um ministro da Fazenda com bom trânsito entre empresários, banqueiros e políticos. É preciso por em prática um programa sólido para reequilibrar a economia e reconquistar a confiança da população.

O detalhamento dos argumentos que motivaram os diretores do BC a elevar a taxa Selic em 0,25 pontos percentuais, para 11,25% ao ano, será conhecido daqui a uma semana com a divulgação da ata da reunião. Mas os motivos gerais são conhecidos.

Deterioração das contas públicas, falta de rumo na condução da política econômica, incertezas sobre os efeitos dos reajustes dos preços administrados na inflação, crescimento da dívida pública, excesso de recursos aplicados no curto prazo e situação internacional menos favorável formam o cenário que justifica a ação do Copom.

Novos aumentos tendem a ocorrer. A melhor estratégia de investimento no momento é manter as aplicações líquidas e aproveitar as oportunidades quando as taxas voltarem a cair.

O lado positivo da decisão do BC é evitar um período desnecessário de transição para um governo que foi reeleito. E pode, também, eliminar as especulações sobre a perda do grau de investimento em função da postergação das decisões.

Resta aos governantes o trabalho sério, com a mesma gana que foi usada para ganhar as eleições.

Ministro da Fazenda biônico

A esperança do mercado financeiro é que a presidente Dilma acate as sugestões e nomeie um ministro da Fazenda comprometido em seguir uma determinada cartilha. Idealmente, a missão seria controlar as contas públicas e manter o grau de investimento do país, conforme os critérios das agências de “rating”.

É uma aposta arriscada. Como as demandas sociais são maiores do que a oferta de recursos, a tendência é de que o restante do governo fique sempre contrário às determinações da Fazenda. Para administrar os conflitos, o novo ministro precisaria ter superpoderes.

Um importante teste sobre a disposição do governo para enfrentar os problemas ocorrerá na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) desta semana.

Os integrantes do Copom possuem dados mostrando que a economia brasileira não vai bem. Existe excesso de recursos investidos no curto prazo e incertezas a respeito do equilíbrio entre o ritmo do crescimento do consumo e a capacidade de aumento da oferta de produtos e serviços.

O ambiente justificaria, ao menos, uma discussão sobre a conveniência de subir os juros para debelar a ameaça do aumento ainda maior da inflação. Especialmente considerando as atuais incertezas na condução da política econômica.

A despeito da decisão final sobre o patamar da taxa Selic, seria importante conhecer a opinião dos membros do Copom sobre a perspectiva da economia. A percepção de independência do BC em relação ao governo sairia fortalecida.

Na atual circunstância, a solução para preencher o Ministério da Fazenda parece ser desenvolver uma espécie de robô, insensível aos argumentos das demais áreas do governo. Seria programado apenas para equilibrar o orçamento.

Ou voltar atrás e manter no cargo o ministro Mantega, que possui um histórico comprovado de jogo de cintura e flexibilidade para enfrentar situações difíceis.

Perigo é a “desconstrução” das agências de risco

Definida a reeleição da presidente Dilma, o próximo passo é conhecer as ideias novas do governo novo. Enquanto um conjunto de medidas coerentes para lidar com os atuais desafios do país não for anunciado, as oscilações da bolsa, juros e câmbio tendem a continuar fortes.

É um ambiente difícil para administrar os investimentos pessoais. Nessa altura, o melhor cenário seria o governo afirmar que tem como objetivo manter a classificação de grau de investimento concedido pelas agências de risco internacionais. Com isso, poderia ser mantida uma certa racionalidade nos negócios, apesar do esperado aumento do sobe e desce das cotações.

No entanto, se tiver início uma campanha de “desconstrução” das agências visando minimizar os efeitos de um eventual rebaixamento da nota da economia brasileira, o panorama muda. O sinal seria de aposta redobrada na política econômica heterodoxa, cujos resultados foram ruins.

O crescimento econômico do Brasil é baixo, a inflação ultrapassou o teto da meta e o déficit em transações correntes do balanço de pagamentos é elevado. O rumo atual precisa ser corrigido.

A entrada de recursos externos no Brasil pela via dos investimentos estrangeiros diretos (IED) tem possibilitado financiar a saída de recursos do país. Isso ajuda a manter o atual patamar de reservas internacionais em torno de US$ 270 bilhões, descontadas as operações com swaps do Banco Central.

O gráfico abaixo mostra que é razoável supor que existe uma relação entre o fluxo de IED e as notas do Brasil concedidas pelas agências de risco.

A linha azul indica o montante de entrada de recursos de IED em intervalos de 12 meses, em bilhões de dólares. A linha vermelha mostra a nota de risco do Brasil atribuída pela agência Standard and Poor’s (S&P). A classificação BBB- é o piso para o grau de investimento.

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Nos últimos anos o Brasil tem recebido cerca de US$ 60 bilhões por ano de investimentos estrangeiros, apesar do clima negativo da economia internacional. Essa entrada de recursos externos tem garantido uma certa estabilidade para o país.

Manter a classificação de risco com o objetivo de facilitar o financiamento das contas externas significa adotar políticas mais tradicionais, em muitos casos opostas ao que vem sendo realizado pelo atual governo Dilma.

A guinada é uma questão de tempo. O melhor cenário para os investidores é que seja feita rapidamente.

Os investimentos depois das eleições

O fim da disputa eleitoral tem potencial para estimular mudanças nas atuais preferências dos investidores. Na renda fixa, existe grande probabilidade de que o tradicional conforto desapareça. Investimentos com liquidez imediata ou rendimentos com isenção fiscal, atrelados aos juros de curto prazo e com ganhos superiores à inflação não são sustentáveis numa economia equilibrada. A conta para o país simplesmente não fecha.

Logo, a alternativa para tentar manter o retorno no caso da queda dos juros seria ampliar o prazo do investimento. Ou, então, aplicar em fundos com estilos de gestão adaptados ao novo ambiente, especialmente se a economia brasileira ingressar num novo ciclo de desenvolvimento.

Na bolsa, a especulação de curto prazo com os papéis do “kit eleições”, formado por ações de estatais e bancos, está com os dias contados. Outras estratégias, tais como a aposta no desempenho de companhias com melhores perspectivas de crescimento das receitas e dos lucros, tendem a ocupar o espaço.

Num cenário otimista, para suprir as novas demandas dos investidores por aplicações diferenciadas, ofertas públicas de ações e outras operações com títulos e valores mobiliários ficariam mais frequentes. E a diversificação poderia ter lugar de destaque nos portfólios, desde que os riscos fossem corretamente identificados.

No entanto, apesar do potencial clima de otimismo com o fim do período eleitoral, não se pode descartar a chance de as coisas darem errado. Uma possibilidade é o próximo governo ser obrigado a fazer um ajuste mais forte e simultâneo no balanço de pagamentos e nas contas públicas. Nesse caso, a consequência seria uma combinação de alta do dólar, crescimento econômico baixo e inflação acima do atual patamar. Os melhores investimento financeiros nesse cenário são, necessariamente, diferentes.

Ao que tudo indica, a melhor alocação para os investimentos nos próximos meses dependerá da forma como o futuro governo, independentemente do vencedor da eleição de domingo, irá promover os ajustes na economia brasileira. Nessa altura da corrida presidencial, já ficou claro que as políticas efetivas dos candidatos só serão conhecidas com o passar do tempo.

A contrapartida é que o atual ambiente gerou muitas incertezas. A reação dos investidores para conviver com esse clima foi o aumento das posições em aplicações com liquidez imediata.

Reportagem de Angela Bittencourt e Lucinda Pinto, do Valor, ilustra esse fato, destacando o aumento do volume de operações compromissadas do Banco Central. Estima-se que o atual montante de aplicações junto ao BC é de R$ 920 bilhões, ou 20% do PIB. É um recorde histórico.

Uma das funções do BC é regular a liquidez do sistema financeiro. As operações entre a autoridade monetária e os bancos são comuns e servem para dar previsibilidade às atividades bancárias.

O excesso de recursos do sistema financeiro estacionado no BC é sintoma de falta de confiança. A remuneração dos bancos poderia ser maior se os valores estivessem aplicados em operações de empréstimos ou em títulos públicos ou privados.

O atual período eleitoral é marcado por sinais contraditórios. Por exemplo, apesar do excesso de recursos aplicados no curto prazo, os juros se mantêm em patamar relativamente estável. A Selic está em 11% ao ano desde a reunião do Copom do início do mês de abril. Ainda mais relevante é observar o comportamento da diferença entre as taxas das Notas do Tesouro Nacional (NTN), considerando os títulos prefixados (série F), e os papéis indexados à inflação (NTN-B série B), ambos com vencimento acima de cinco anos.

A relação entre os juros prefixados da NTN-F com vencimento em janeiro de 2021 e a remuneração da parcela acima da inflação da NTN-B para agosto de 2020 tem ficado aproximadamente constante. Desde julho deste ano a diferença oscila ao redor de 5,8% ao ano.

A disputa eleitoral parece não ter influência acentuada sobre o comportamento esperado para a inflação nos próximos anos. A perspectiva é de que o novo governo manterá uma política econômica equilibrada.

Já no câmbio, mercado tradicionalmente mais volátil, a sinalização foi diferente. A cotação subiu de R$ 2,20 no início de julho para R$ 2,45 mais recentemente. Isso ocorreu mesmo com o intenso volume de intervenções do BC.

Disputa

No curto prazo, a tendência é que a inflação suba. Mas tudo indica que ainda permanecerá abaixo da rentabilidade das aplicações atreladas ao CDI.

Para o futuro, se houver coordenação das políticas econômicas no próximo governo, é possível que os esforços do Ministério da Fazenda e do BC sejam intensificados para reduzir inflação e fazer a economia crescer novamente. Nesse caso, alongar as aplicações, garantindo o atual nível de juros, tanto dos títulos prefixados quanto dos indexados à inflação, pode proporcionar bons lucros.

Esse cenário é incerto. Assim, a despeito da expectativa para a política econômica do novo governo, é importante ficar atento às oportunidades de investimento, inclusive avaliando as novas modalidades que podem surgir.

E se a dívida total fosse menor?

Conforme relata Cristiano Romero em sua coluna no Valor, o departamento econômico do BNDES fez um estudo concluindo que os financiamentos subsidiados do banco estatal de fomento têm impacto pequeno sobre o patamar da taxa Selic.

A análise teve foco na influência dos investimentos financiados pelo banco sobre o aumento da demanda agregada. No entanto, se o estoque da dívida pública fosse menor, não seria possível que governo e empresas pudessem captar recursos com juros mais baixos? Essa questão não foi abordada.

Para que o BNDES possa emprestar, o Tesouro Nacional precisa repassar recursos para o banco. De dezembro de 2006 até agosto de 2014, os créditos concedidos a instituições financeiras oficiais, conforme a contabilização do Tesouro, saltaram de 0,5% para 10% do Produto Interno Bruto (PIB). O gráfico abaixo ilustra a evolução.

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Para financiar os repasses ao BNDES e demais bancos oficiais, o Tesouro mantém um estoque de dívida pública elevada. A dívida bruta do governo geral tem oscilado na faixa de 55% a 60% do PIB desde dezembro de 2006. Atualmente é de 60% do PIB.

O bom senso sugere que existe uma relação positiva entre a taxa de juros e estoque da dívida. Quanto maior a quantidade de títulos públicos a serem rolados, a tendência é que mais alta seja a taxa de juros a ser paga pelo Tesouro.

O argumento do governo é que não é tão relevante a trajetória da dívida bruta. O que realmente importa é a evolução da dívida líquida do setor público, que vem caindo, conforme ilustra o gráfico abaixo.

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Em dezembro de 2006, a dívida líquida do setor público era de 47% do PIB e passou para 36% do PIB em agosto de 2014, o dado mais recente. A queda de 11 pontos percentuais foi praticamente equivalente ao crescimento dos créditos concedidos a instituições financeiras oficiais.

Haveria, então, uma contrapartida para a elevada dívida bruta, representada, principalmente, pelos créditos junto aos bancos oficiais.

É preciso avaliar a solidez e consistência da política econômica de endividamento do governo a juros de mercado com o objetivo de repassar recursos para o BNDES emprestar a taxas subsidiadas. Talvez seja tema para um próximo estudo do departamento econômico do banco.

A despeito de todas as disputas políticas, acompanhar essas discussões é fundamental para os investidores. Isso irá determinar, em larga medida, a evolução da nota de crédito concedida pelas agências de classificação de risco.

Um rebaixamento para um patamar inferior ao grau de investimento pode ter consequências graves para o país.

Inflação irá subir, mas tende a seguir menor do que os juros

Ser for repetido o padrão histórico recente, os próximos seis meses serão de inflação elevada e juros altos. Um cenário ruim, mas conhecido.

A variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) é normalmente maior no período que abrange o último trimestre do ano e os primeiros três meses do ano seguinte. E um pouco mais baixa entre o segundo e o terceiro trimestre de cada ano.

As barras azuis do gráfico abaixo mostram as épocas do ano em que a inflação é mais baixa. E as barras vermelhas indicam quando ela é mais alta. Os intervalos são de seis meses e as taxas foram anualizadas.

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O pico mais recente da inflação ocorreu entre o quarto trimestre de 2010 e o primeiro trimestre de 2011. O IPCA subiu 9,66% ao ano e coincidiu com o período de transição entre os governos Lula e Dilma.

A reação para controlar a inflação foi aumentar os juros. Em outubro de 2010, a taxa Selic estava em 10,75% ao ano. Em janeiro de 2011, a taxa básica subiu para 11,25% ao ano e começou um ciclo de alta. Atingiu o ponto máximo de 12,50% ao ano no intervalo entre meados de julho e o fim de agosto de 2011.

As aplicações financeiras indexadas ao CDI renderam 10,82% ao ano nesse período de IPCA alto. Para os investidores, o resultado foi um ganho real (acima da inflação) de pouco mais de um ponto percentual, antes do Imposto de Renda.

O padrão de remuneração dos investimentos de baixo risco no Brasil tem sido o de garantir juros maiores do que a inflação. A exceção foram os seis meses compreendidos entre outubro de 2012 e março de 2013, quando o IPCA foi equivalente a 8,11% ao ano.

A taxa Selic da época foi, na maior parte do tempo, fixada em 7,25% ao ano, o recorde de baixa. As aplicações indexadas ao CDI, por sua vez, renderam 6,79% ao ano. Menos, portanto, do que a inflação.

Aquele foi, também, um período crítico para a administração da economia. Avaliando retrospectivamente, o governo Dilma teve que desistir da ênfase nas medidas consideradas mais intervencionistas e acabou sendo forçado a aceitar a política tradicional de elevação da taxa Selic.

Para os investidores, a consequência foi o ganho real das aplicações no período entre outubro de 2013 e março de 2014. Enquanto a inflação atingiu o equivalente a 8,71% ao ano, a remuneração dos investimentos financeiros indexados ao CDI foi de 9,76% ao ano.

Os últimos seis meses registraram variação do IPCA de 4,82% ao ano. Nos próximos seis meses a previsão, virtualmente unânime, é de que a inflação será maior.

O atual patamar da taxa Selic em 11% ao ano parece garantir aos investidores que as aplicações financeiras irão render mais do que a inflação. Pelo menos no horizonte de dois trimestres.

Depois disso, tudo irá depender do novo governo eleito e da política econômica que será adotada.