Investir se tornou negócio mais arriscado após Lava Jato

A forte alta do dólar em relação ao real e a queda expressiva do preço das ações e dos títulos públicos brasileiros em 18 de maio, um dia depois que o presidente Michel Temer foi envolvido em acusações pela JBS, marcou o ápice de uma marcha que começou em março de 2014.

Desde que a Operação Lava Jato inaugurou a fase ostensiva, investir no Brasil passou a ficar cada vez mais arriscado.
Uma das maneiras de estabelecer o risco dos ativos financeiros é medir o grau da oscilação diária dos preços.

Ao aplicar hoje num título de renda fixa vinculado aos juros de curto prazo, por exemplo, a expectativa é que no fim de um ano a rentabilidade atinja por volta de 8,6%. A variação diária é bem pequena e, no fim, a acumulação das taxas tende a garantir o retorno próximo ao esperado.

Já o investimento na Bolsa é muito menos previsível. A rentabilidade diária do Ibovespa, o principal índice do mercado brasileiro, pode facilmente ultrapassar a marca de 1%, para cima ou para baixo.

A consequência é que, no fim do período de um ano, o rendimento total da aplicação em ações pode ser muito diferente do que foi originalmente imaginado. O risco está associado à dificuldade de prever a rentabilidade futura.

Os especialistas do mercado financeiro desenvolveram um método para estimar o risco dos ativos, conhecido no jargão como volatilidade. Por esse critério, é possível comparar diferentes riscos nos mais variados mercados.

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Até o começo de 2014, a volatilidade do mercado de ações no Brasil era, em média, 50% maior do que nos demais países emergentes. Desde março de 2014, essa diferença vem aumentando e atingiu o pico de sete vezes em 18 de maio. Além da intensificação da Lava Jato, houve uma eleição apertada, o impeachment e a troca do governo nesse período.

A redução do risco político é fundamental para reduzir as surpresas com os ganhos das aplicações financeiras.

Artigo originalmente publicado na Folha de São Paulo

Impacto das perdas do dia 18 de maio nos investimentos

Em finanças, um evento considerado raro, mas que após um período acaba acontecendo com frequência maior do que o anteriormente imaginado, é chamado de “cisne negro”. O professor e investidor Nassim N. Taleb foi o responsável pela popularização do conceito.

Tradicionalmente, a premissa usada para avaliar os ativos financeiros é que existe certa expectativa de retorno associada a uma determinada incerteza, causada por fatores aleatórios.

Por exemplo, ao estudar uma empresa um analista pode concluir que o lucro tende a crescer 10% naquele ano. No entanto, dadas as oscilações intrínsecas do negócio, pode estabelecer que o intervalo de crescimento dos ganhos da companhia ficará entre 0% e 20%, com 95% de confiança nas suas projeções.

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De posse dessa informação, um investidor que possua como alternativa aplicar num título com rendimento garantido de 8% no fim de um ano tem condições de decidir o que é mais vantajoso: arriscar para tentar aumentar o ganho em dois pontos percentuais comprando ações da companhia ou escolher a aplicação segura.

A probabilidade de o lucro da companhia triplicar é considerada remota, para efeitos dessa análise. De forma inversa, a chance de falência da empresa é considerada desprezível.

Nesse ambiente idealizado, as alocações de investimento são feitas considerando o montante de risco que se quer correr visando atingir determinado retorno. Quanto maior o risco assumido, maior será a possibilidade de lucros. A contrapartida é que os prejuízos também podem ser grandes.

Uma política de administração de riscos, então, passa a ser essencial. Existem diversos indicadores usados para medir as incertezas. Um dos mais populares é o chamado VaR, a sigla em inglês para valor em risco.

O objetivo do VaR é estabelecer a perda máxima esperada de uma carteira de aplicações diversificadas em títulos e valores mobiliários, considerando um certo nível de confiança, na hipótese de ocorrer uma queda generalizada dos mercados.

Como parâmetros para o indicador, são considerados a oscilação dos ativos no passado e o grau de correlação entre eles. O risco da carteira é diretamente proporcional à correlação.

O problema é que, muitas vezes, as surpresas são mais intensas do que o originalmente previsto pelos modelos estatísticos. E o prejuízo acaba ultrapassando o que foi estimado.

Um exemplo ocorreu em 18 de maio, o dia seguinte à divulgação da delação dos sócios e executivos da JBS, que enredou a companhia e uma longa lista de políticos em atividades consideradas ilícitas.

No fechamento daquele dia, o IMA Geral – indicador que mede o comportamento dos títulos públicos de renda fixa – caiu 3,6%, o Real desvalorizou quase 9% e o Ibovespa perdeu 8,8%. O tamanho dos prejuízos foi surpreendente.

Considerando como referência o VaR de 1 dia, com 99% de confiança e a volatilidade registrada entre 2 de janeiro e 17 de maio de 2017, a queda do IMA Geral no dia 18 de maio foi 12,4 vezes superior ao que seria esperado. Pelos mesmos critérios, a desvalorização cambial foi 5,5 vezes maior e o prejuízo do Ibovespa foi 3,4 vezes acima do previsto.

A queda acentuada e surpreendente dos indicadores teve reflexos nos fundos de investimento, principalmente os das categorias ações e multimercado.

Entre os fundos de ações com patrimônio acima de R$ 10 milhões e mais de 50 cotistas, 88% registraram queda entre 3 a 6 vezes superior ao respectivo VaR de 1 dia e com 99% de confiança. Apenas 5% perderam mais do que 6,0 vezes o VaR. O restante perdeu até 3,0 vezes o VaR. Os dados são da Morningstar.

Já entre os multimercados, usando o mesmo corte, o desempenho foi mais disperso e pode ser dividido em três grupos com quantidades iguais de carteiras. O primeiro grupo contabilizou perdas de até 3,0 vezes o VaR. O segundo, registrou perdas entre 3,0 e 9,0 vezes o VaR. E o terceiro amargou perdas superiores a 9,0 vezes o VaR.

Perdas como as que ocorreram no dia 18 de maio tendem a se repetir com alguma frequência. Especialmente porque quanto menor a volatilidade em determinado período, maior tendem ser as apostas.

Daí a ideia de Taleb de apostar nos cisnes negros e nos chamados ativos “antifrágeis”, outro conceito desenvolvido pelo professor e investidor. O ideal seria buscar alternativas que produzam ganhos com eventos extremos.

Os gestores de fundos possuem uma série de argumentos para justificar o desempenho das carteiras que administram. Do ponto de vista pragmático, para o investidor, o mais importante é entender as estratégias que serão adotadas daqui por diante. E manter, como regra geral, as aplicações da forma mais simples possível.