Em finanças, um evento considerado raro, mas que após um período acaba acontecendo com frequência maior do que o anteriormente imaginado, é chamado de “cisne negro”. O professor e investidor Nassim N. Taleb foi o responsável pela popularização do conceito.
Tradicionalmente, a premissa usada para avaliar os ativos financeiros é que existe certa expectativa de retorno associada a uma determinada incerteza, causada por fatores aleatórios.
Por exemplo, ao estudar uma empresa um analista pode concluir que o lucro tende a crescer 10% naquele ano. No entanto, dadas as oscilações intrínsecas do negócio, pode estabelecer que o intervalo de crescimento dos ganhos da companhia ficará entre 0% e 20%, com 95% de confiança nas suas projeções.
De posse dessa informação, um investidor que possua como alternativa aplicar num título com rendimento garantido de 8% no fim de um ano tem condições de decidir o que é mais vantajoso: arriscar para tentar aumentar o ganho em dois pontos percentuais comprando ações da companhia ou escolher a aplicação segura.
A probabilidade de o lucro da companhia triplicar é considerada remota, para efeitos dessa análise. De forma inversa, a chance de falência da empresa é considerada desprezível.
Nesse ambiente idealizado, as alocações de investimento são feitas considerando o montante de risco que se quer correr visando atingir determinado retorno. Quanto maior o risco assumido, maior será a possibilidade de lucros. A contrapartida é que os prejuízos também podem ser grandes.
Uma política de administração de riscos, então, passa a ser essencial. Existem diversos indicadores usados para medir as incertezas. Um dos mais populares é o chamado VaR, a sigla em inglês para valor em risco.
O objetivo do VaR é estabelecer a perda máxima esperada de uma carteira de aplicações diversificadas em títulos e valores mobiliários, considerando um certo nível de confiança, na hipótese de ocorrer uma queda generalizada dos mercados.
Como parâmetros para o indicador, são considerados a oscilação dos ativos no passado e o grau de correlação entre eles. O risco da carteira é diretamente proporcional à correlação.
O problema é que, muitas vezes, as surpresas são mais intensas do que o originalmente previsto pelos modelos estatísticos. E o prejuízo acaba ultrapassando o que foi estimado.
Um exemplo ocorreu em 18 de maio, o dia seguinte à divulgação da delação dos sócios e executivos da JBS, que enredou a companhia e uma longa lista de políticos em atividades consideradas ilícitas.
No fechamento daquele dia, o IMA Geral – indicador que mede o comportamento dos títulos públicos de renda fixa – caiu 3,6%, o Real desvalorizou quase 9% e o Ibovespa perdeu 8,8%. O tamanho dos prejuízos foi surpreendente.
Considerando como referência o VaR de 1 dia, com 99% de confiança e a volatilidade registrada entre 2 de janeiro e 17 de maio de 2017, a queda do IMA Geral no dia 18 de maio foi 12,4 vezes superior ao que seria esperado. Pelos mesmos critérios, a desvalorização cambial foi 5,5 vezes maior e o prejuízo do Ibovespa foi 3,4 vezes acima do previsto.
A queda acentuada e surpreendente dos indicadores teve reflexos nos fundos de investimento, principalmente os das categorias ações e multimercado.
Entre os fundos de ações com patrimônio acima de R$ 10 milhões e mais de 50 cotistas, 88% registraram queda entre 3 a 6 vezes superior ao respectivo VaR de 1 dia e com 99% de confiança. Apenas 5% perderam mais do que 6,0 vezes o VaR. O restante perdeu até 3,0 vezes o VaR. Os dados são da Morningstar.
Já entre os multimercados, usando o mesmo corte, o desempenho foi mais disperso e pode ser dividido em três grupos com quantidades iguais de carteiras. O primeiro grupo contabilizou perdas de até 3,0 vezes o VaR. O segundo, registrou perdas entre 3,0 e 9,0 vezes o VaR. E o terceiro amargou perdas superiores a 9,0 vezes o VaR.
Perdas como as que ocorreram no dia 18 de maio tendem a se repetir com alguma frequência. Especialmente porque quanto menor a volatilidade em determinado período, maior tendem ser as apostas.
Daí a ideia de Taleb de apostar nos cisnes negros e nos chamados ativos “antifrágeis”, outro conceito desenvolvido pelo professor e investidor. O ideal seria buscar alternativas que produzam ganhos com eventos extremos.
Os gestores de fundos possuem uma série de argumentos para justificar o desempenho das carteiras que administram. Do ponto de vista pragmático, para o investidor, o mais importante é entender as estratégias que serão adotadas daqui por diante. E manter, como regra geral, as aplicações da forma mais simples possível.