Um ano em que até as estrelas tiveram perdas

Os rankings de fundos de investimento privilegiam a consistência. Afinal, ao delegar seus recursos a um gestor profissional, o que o investidor mais deseja é ganhar sempre, independentemente das condições de mercado.

A esperança é que os administradores de carteira tenham habilidade para identificar oportunidades de lucro nos mais diversos cenários. Se não for possível acertar todas as apostas, que pelo menos consigam evitar perdas nos momentos difíceis.

O ano de 2013 foi um duro teste. Mesmo os fundos mais bem avaliados pela Standard & Poor’s (S&P) amargaram períodos com prejuízos relevantes em certos momentos.

A avaliação das carteiras é feita com exclusividade para o Valor. A relação completa com os melhores fundos foi publicada em caderno especial na edição de 10 de dezembro. Os critérios de classificação premiam a previsibilidade do desempenho.

Fundos que atingiram a maior relação entre retorno e risco em determinado intervalo de tempo recebem a qualificação de cinco estrelas. Carteiras com comportamento equivalente à média do setor ganham três estrelas. Se o retorno for muito baixo ou a oscilação da rentabilidade muito alta, a nota máxima é de apenas duas estrelas.

Para o investidor, o ranking oferece um instrumento para comparar, de maneira simples, as alternativas disponíveis. Com a ressalva de que, como em toda simplificação, alguns detalhes podem não ser integralmente computados na avaliação.

A despeito de eventuais críticas aos critérios da metodologia, a análise mais detalhada do desempenho dos fundos premiados neste ano evidencia os efeitos das turbulências enfrentadas pelos investidores. E pode ser um sinal de alerta para o padrão das oscilações das aplicações financeiras daqui para frente.

Uma medida para dimensionar o risco do investimento é dada pela perda máxima verificada em determinado intervalo. Além disso, depois do prejuízo contabilizado, interessa saber quanto tempo demorou até que o investimento voltasse ao terreno positivo.

Aplicações pouco arriscadas tendem a proporcionar perdas pequenas e recuperação rápida. Em contrapartida, o padrão das modalidades com risco elevado envolve diversos períodos com prejuízos altos e recuperação demorada.

Para o investidor que não conta com a calma necessária para esperar pela recuperação dos mercados, que tenha perdido a confiança no gestor ou que, simplesmente, precisa sacar os recursos imediatamente, perdas momentâneas elevadas podem significar prejuízos definitivos. Por isso, os gestores se esforçam para evitar perdas das cotas.

Nos fundos de investimento, uma estratégia para amortecer possíveis perdas com apostas erradas é concentrar a carteira em papéis atrelados aos juros de curto prazo. Essa maneira de gerir a carteira é eficaz quando a taxa Selic é alta.

Os juros elevados garantem um colchão para a rentabilidade mínima da carteira. Mesmo se alguns investimentos mais arriscados não proporcionarem o retorno esperado, as perdas não serão suficientes para afetar de modo significativo o desempenho da carteira global.

Estratégias desse tipo foram aprimoradas pelos administradores de recursos brasileiros. E, também, sempre garantiram ótima posição nos rankings que premiam a relação entre retorno e risco, tal como o elaborado pela S&P.

O juro baixo na primeira metade de 2013, no entanto, obrigou os gestores a adaptar as posições para tentar obter melhores resultados. Alongamento do prazo das aplicações, apostas em operações estruturadas e investimentos em ativos negociados no exterior são exemplos de transações que passaram a fazer parte do arsenal dos gestores locais.

A consequência foi o aumento do risco. Dos dez fundos com cinco estrelas mais rentáveis no ano até o dia 11 de dezembro de 2013, todos registraram algum período de perdas. É um fato raro comparando com os rankings anteriores.

Foram consideradas, nesse levantamento específico, apenas as carteiras potencialmente acessíveis aos investidores, com mais de 100 cotistas e patrimônio acima de R$ 100 milhões. Todas conseguiram superar a variação da taxa Selic no período, que foi de 7,70%.

As maiores perdas foram registradas pelos fundos de ações. Mas mesmo os fundos multimercados mais conservadores tiveram algum período com prejuízo. Todos os dez fundos conseguiram voltar ao terreno positivo após sofrerem as quedas.

Daqui para frente, a tendência é que os juros sejam menores do que foram no passado, mesmo com as turbulências visíveis no horizonte. Assim, inevitavelmente, para aumentar os ganhos, os investidores terão que arriscar mais.

Em um mercado instável e com muita incerteza, a saída é dedicar tempo para conhecer a estratégia de cada gestor e avaliar constantemente o desempenho do fundo.

Pirâmides financeiras e marketing multinível

Para Bill Ackman, gestor da Pershing Square, um “hedge fund” americano, Herbalife é uma transação para a vida.

Não que ele seja fã do modelo de negócios da empresa global de suplementos alimentares, muito pelo contrário. Ackman acredita que, no fundo, a Herbalife explora um esquema de pirâmide financeira e que, cedo ou tarde, a companhia irá à falência.

Ackman vendeu ações a descoberto da empresa, uma posição que garante lucros caso os papéis caiam de preço. Até agora, no entanto, o resultado do investimento tem sido péssimo. A estimativa é de que os investidores da Pershing Square estejam contabilizando prejuízos de US$ 500 milhões desde dezembro do ano passado com a aposta. Isso porque as ações da Herbalife subiram do patamar de US$ 30 para US$ 70 no período.

Mas Ackman continua determinado, mesmo com os rumores de que a empresa poderá levar adiante uma proposta para fechar o capital e recomprar todas as ações que estão em circulação no mercado. Se isso acontecer, ele declarou que pretende mudar a estratégia. Vai montar operações no mercado de derivativos de crédito para apostar na inadimplência da companhia e consequente desvalorização dos títulos de dívida emitidos para financiar o fechamento de capital.

A convicção do investidor ativista foi renovada a partir de um relatório recente da SEC, o órgão equivalente nos Estados Unidos à Comissão de Valores Mobiliários (CVM). O trabalho da SEC alertou para esquemas de pirâmides financeiras disfarçados de operações de marketing multinível.

A autoridade americana listou sete pontos que merecem a atenção dos potenciais aplicadores. Se o negócio envolver a ênfase no recrutamento, promessas de alto retorno em curto período de tempo, dinheiro fácil ou rendimento passivo e sem esforço, necessidade de compra de produtos para poder revendê-los, estruturas complexas para definir o valor das comissões, nenhum produto ou serviço efetivamente vendido para pessoas que não fazem parte da rede e, finalmente, se não existirem demonstrativos das vendas efetuadas no varejo, é um sinal de alerta.

Ackman viu semelhanças na operação da Herbalife com todos os pontos listados pela SEC. No entanto, a empresa, os revendedores da companhia e diversos investidores de peso refutam as acusações. George Soros, Carhl Icahn e William Stiritz são alguns dos renomados gestores de recursos que possuem ações da Herbalife e estão na posição contrária à da Pershing Square.

Também no Brasil a CVM tem a preocupação de previnir os aplicadores sobre esquemas que podem ser, na verdade, pirâmides financeiras disfarçadas. Segundo a autarquia, o seu serviço de atendimento ao cidadão (SAC) recebe diversas consultas de pessoas com dúvidas sobre a regularidade de propostas de participação em várias “oportunidades de negócios”. Muitas podem acabar lesando os participantes.

No site da CVM, na área de proteção e educação ao investidor, existe um item que reúne as publicações educacionais. Lá são agrupados diversos estudos, incluindo o boletim de proteção ao investidor/consumidor.

Os trabalhos são preparados conjuntamente pela CVM e Secretaria Nacional do Consumidor (Senacom), órgão do Ministério da Justiça. O tema do sexto boletim foram as possíveis relações e semelhanças entre o marketing multinível e as pirâmides financeiras.

Casos de investidores que buscam lucrar com a derrocada de uma determinada companhia são raros. Por isso a disputa com as ações da Herbalife vem chamando tamanha atenção. No entanto, golpes financeiros que envolvem a promessa de ganhos mirabolantes e com pouca explicação de como os lucros serão atingidos são relativamente comuns.

As informações disponibilizadas no site da CVM são fundamentais para esclarecer dúvidas sobre o funcionamento do marketing multinível e evitar cair em golpes, investindo ou participando de esquemas fraudulentos.