O que justifica a valorização das ações no Brasil

No fim deste mês o Ibovespa pode estabelecer uma marca pouco comum. Se o índice fechar acima dos 60 mil pontos, alcançará o quinto trimestre consecutivo de rentabilidade positiva. Atualmente é negociado no patamar de 65 mil pontos.

A última vez que isso ocorreu foi no intervalo entre janeiro de 2009 até março de 2010. A alta acumulada naquele período foi de 87% e corrigiu parte das perdas contabilizadas desde 20 de maio de 2008, ainda hoje o ponto mais alto da série histórica do indicador.

No ano passado o Ibovespa subiu 39%. Petrobras e Vale, duas das principais empresas que fazem parte da carteira do índice, mais do que dobraram de valor.

Fim da recessao

A alta no preço das commodities no mercado internacional justificou grande parte do otimismo com a bolsa brasileira e refletiu na cotação das duas gigantes nacionais. O resgate de ambas empresas da ingerência política que contaminou os negócios das companhias, especialmente no caso da Petrobras, também ajudou na recuperação das cotações.

A esperança que embasa a alta das ações no Brasil é que a economia mundial volte ao ciclo de crescimento econômico. Com a maior demanda por parte dos países industrializados, a tendência é de valorização dos preços de insumos industriais e produtos agrícolas.

Além de beneficiar diretamente as empresas envolvidas nessas atividades, é possível vislumbrar outros ganhos para a economia brasileira. Um dos mais palpáveis é o clima de otimismo em relação aos investimentos produtivos.

O expressivo volume de investimentos estrangeiros diretos no Brasil no ano passado corrobora essa tese. Os dados do balanço de pagamentos divulgados pelo Banco Central apontam para entradas líquidas de mais de 70 bilhões de dólares em 2016.

Mesmo que boa parte dos recursos registrados nessa rubrica seja direcionado para a aquisição de negócios já existentes, o montante de investimentos estrangeiros é significativo. Podem representar, também, uma adequação do balanço de ativos e passivos das companhias, reduzindo o endividamento e dando novo fôlego aos negócios.

Mantendo o clima de otimismo, o Ibovespa acumula alta de quase 10% em 2017. Mas os motivos, agora, parecem um pouco diferentes. Avaliando o comportamento das ações integrantes do IBrX-100, um índice semelhante, mas que engloba quantidade maior de ativos, é possível identificar algumas tendências.

De acordo com o padrão de classificação das empresas por áreas de atuação, conforme definido pela Morningstar, é possível segmentar setorialmente as companhias que fazem parte do IBrX-100. A vantagem é que essa classificação obedece uma metodologia global, aplicável em todos os mercados mundiais.

Existem três grandes grupos de setores de atividade: cíclicos, defensivos e sensíveis. A lógica dessa classificação é agrupar as empresas conforme a influência sobre os negócios, de acordo com as condições gerais da economia.

Fatores específicos podem afetar o desempenho das ações de uma companhia em particular, tais como desenvolvimento de novos produtos, fusões com outras empresas, aquisições de concorrentes ou exploração de novos mercados. No entanto, empresas com atuação no mesmo setor tendem a se comportar de maneira semelhante.

A principal característica das empresas dos setores cíclicos é serem muito afetadas pelas oscilações da economia. Num ambiente de expansão as empresas tendem a ir muito bem, mas se há uma recessão, as companhias enfrentam dificuldades.

Exemplos de setores cíclicos são a indústria química, papel e celulose, varejistas, restaurantes, setor financeiro e imobiliário.

As empresas dos setores defensivos são, de certa forma, imunes ao comportamento econômico. Isso porque os produtos comercializados possuem demanda aproximadamente estável.

Os exemplos são os fabricantes de bebidas, alimentos processados, serviços de educação, saúde e provedores de água, luz e gás.

Já as companhias dos setores sensíveis tendem a ser afetadas pelos altos e baixos da economia, mas de forma menos intensa do que as companhias cíclicas. Como exemplos estão os serviços de comunicação, o setor de energia, aeroespacial, aviação, engenharia e tecnológico.

Nesse primeiro trimestre o setor de consumo cíclico apareceu como destaque. A rentabilidade média das ações deste segmento e que fazem parte do IBrX-100 foi mais de duas vezes superior ao Ibovespa.

Esse conjunto inclui varejistas, empresas de incorporação imobiliária e operadores de viagens. São negócios fortemente afetados pela conjuntura econômica doméstica.

A aposta atual na bolsa é que a economia brasileira sairá rapidamente da atual recessão. Entretanto, é um risco que deve ser administrado com cuidado.

Lições de um prejuízo bilionário

A saga que envolveu a divulgação do balanço auditado da Petrobras mostrou duas importantes lições aos investidores.

A primeira é que a corrupção custa muito mais caro do que o valor desembolsado com as propinas. A segunda é que se o governo não acredita no mercado de capitais, a estratégia mais prudente é evitar comprar papéis de companhias estatais.

A Petrobras reconheceu baixa contábil de R$ 6 bilhões referente a “gastos capitalizados indevidamente”. Tratam-se de valores superfaturados, estimados a partir das investigações da operação “lava-jato” e que ocasionou a prisão de uma série de diretores da empresa.

Além disso, foram feitas provisões adicionais de R$ 45 bilhões em virtude, principalmente, das “perdas decorrentes de problemas de planejamento de projetos”. A motivação para esses erros de avaliação parece estar fortemente correlacionada com os atos de corrupção praticados em alguns setores da companhia.

No fim, a conta da má gestão apresentada pela nova administração aos acionistas da Petrobras ultrapassou R$ 50 bilhões. O prejuízo em 2014 foi de R$ 22 bilhões, um recorde para as empresas de capital aberto e que justifica a queda de 40% no valor de mercado da companhia no ano passado.

Os números finalmente revelados no balanço foram uma má notícia para os acionistas. E sugerem que a nova administração terá muito trabalho para recolocar a companhia no ritmo de crescimento rentável e sustentável.

Entretanto, a face mais negativa de todo o episódio foi o aparente descaso dos últimos governos com a robustez do mercado de capitais.

Diversos dos atuais acionistas da Petrobras compraram ações no âmbito do antigo Programa Nacional de Desestatização, que tinha por objetivo vender participações em companhias detidas pelo BNDES. Os pequenos investidores podiam comprar os papéis usando parte dos recursos depositados no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

Depois das ofertas públicas de Petrobras e Vale, esse programa foi abandonado. Outra ideia era estimular a diversificação, incentivando a transferência de recursos para carteiras compostas por maior variedade de ativos. Esse objetivo também ficou pelo caminho.

Mais tarde, outro baque. A estrutura da operação de capitalização da Petrobras, na qual o governo diluiu os acionista minoritários sem participar com o dinheiro necessário para financiar a expansão da empresa,  gerou ressentimentos e desconfiança.

Devido ao balanço ruim, é possível que ocorra o fechamento do mercado internacional para captações da Petrobras. Para suprir essa lacuna de caixa, o governo pode voltar a acenar para o mercado de capitais local.

Um dos caminhos é a Petrobras oferecer debêntures de infraestrutura, isentas de Imposto de Renda. Todavia, dado o histórico recente, é recomendável que o investidor mantenha a cautela.

Caso Petrobras: desistir ou persistir?

Nos últimos cinco anos, o valor das ações da Petrobras caiu mais de 70%. O momento é de desistir do investimento na companhia, atolada em escândalos de corrupção e incapaz de divulgar sequer o balanço auditado, ou o mais sensato é persistir, apostando numa eventual recuperação?

No capítulo sobre a lógica do raciocínio humano no volume editado por G. J. Madden, intitulado “APA Handbook of Behavior Analysis”, E. Fantino e S. Stolarz-Fantino abordam as falhas mais frequentes nas decisões que tomamos no nosso dia a dia. Um dos temas é o “efeito dos custos perdidos” (“sunk-cost effect”).

Segundo os pesquisadores, quando as pessoas investem tempo ou dinheiro em determinadas atividades ou aplicações financeiras, ficam mais propensas a insistir naquele rumo estabelecido, mesmo que o resultado final esperado comece a se mostrar questionável.

A atitude contraria a noção, largamente incorporada ao comportamento humano racional, de que as escolhas devem ser feitas baseadas nos custos e benefícios previstos para o futuro. Nesse contexto, o passado é irrelevante.

Mais fácil pensar do que agir. Devido ao tamanho do comprometimento anterior, nossa tendência é de postergar ajustes. A correção de rota deixa de ser planejada, considerando a lógica das perspectivas. E aspectos emocionais passam a dominar as decisões.

Atualmente, os efeitos dos custos perdidos podem estar influenciando a avaliação de muitos investidores em ações da Petrobras. A empresa possui uma sólida base de aplicadores, muitos com posições mantidas há anos e que vivenciaram os melhores momentos da companhia. A esperança é de que os bons tempos possam voltar.

Chassi

Um fator adicional que potencializa os efeitos dos custos perdidos é a valorização da persistência em nossa sociedade. Atitudes perseverantes são vistas como fator fundamental para o exercício do autocontrole e uma forma de se evitar decisões impulsivas. Há inúmeros casos pessoais e empresariais de sucesso que foram alcançados após um longo período de dificuldades. Em outros contraexemplos, para ilustrar o valor da determinação, a desistência aconteceu muito perto de o objetivo ser atingido, provocando arrependimento.

Daniel Kahneman, prêmio Nobel de economia e estudioso do comportamento humano, avaliando os efeitos das escolhas, buscou entender o sentimento de incômodo que pode ser provocado quando decisões são tomadas. Segundo ele, sair de uma atitude padrão tem potencial muito maior de gerar arrependimento se o resultado final não for o esperado.

Por exemplo, a opção por se desfazer de uma aplicação deficitária, assumindo o prejuízo, e depois assistir à alta desse ativo provoca mais dor do que manter intocado o investimento e continuar contabilizando as perdas. Nessas situações é mais confortável emocionalmente persistir do que desistir.

Uma das principais contribuições dos pesquisadores no campo da análise comportamental é explicar a lógica das atitudes que parecem irracionais. Em relação aos efeitos dos custos perdidos especificamente, a distorção tende a acontecer em virtude da influência dos incentivos e da forma como as recompensas e reforços são percebidos.

Considere o caso das ações da Petrobras. Apesar da queda brutal do preço das ações desde 2010, houve pelo menos seis intervalos em que a valorização dos papéis foi de mais de 20% em curto espaço de tempo.

A estatal aumentou o faturamento em 43% entre 2010 e 2013, passando de R$ 213 bilhões para R$ 305 bilhões. Outros indicadores de desempenho foram igualmente positivos. Isso tudo sem falar do otimismo provocado pela descoberta do pré-sal.

Ocorre que o conjunto de informações acaba atrapalhando o processo de decisão do investidor. A dificuldade, cada vez mais esmiuçada pelos especialistas, é como selecionar os dados relevantes e interpretar os resultados corretamente, sem cair nas armadilhas dos chamados vieses comportamentais.

Hoje a Petrobras possui um problema concreto. A atual administração da companhia tem se mostrado incapaz de lidar com os problemas derivados das investigações de atos de corrupção na empresa.

Em contrapartida, o cenário futuro dos negócios parece promissor, se a direção for capaz de recolocar a gestão nos trilhos. Mas é impossível medir a chance de cada desdobramento.
Do ponto de vista dos incentivos recebidos pelos detentores de ações da Petrobras nos últimos anos, a atitude mais indicada é vender, aguardar a mudança dos administradores da empresa e esperar pela elaboração de um plano de negócios convincente.

No entanto, os especialistas na análise fundamentalista, que procura determinar o valor justo da empresa, podem ter recomendação diferente. É importante conhecer a opinião desses profissionais.

De qualquer forma, a vantagem da liquidez nas negociações no mercado acionário é a possibilidade de desistir e, depois de determinado tempo, voltar a persistir. O que acaba sendo muito mais fácil de se praticar quando a carteira é suficientemente diversificada.

O derretimento da Petrobras

É inegável que o desempenho das ações da Petrobras tem sido sofrível durante o governo Dilma. Desde 7 de março de 2011, quando atingiu o pico de R$ 413 bilhões, até 14 de abril de 2014, com cotação de R$ 203 bilhões, o valor de mercado da empresa recua 50%.

Já o segundo mandato do presidente Lula foi excitante para os acionistas da empresa. O valor da companhia saltou de R$ 228 bilhões no início do governo para o pico de R$ 510 bilhões em maio de 2008.

Depois, devido aos efeitos da crise financeira mundial, chegou a cair quase 70%, para R$ 165 bilhões em novembro de 2008. No fim do período Lula, o valor terminou em R$ 380 bilhões, quase o dobro do patamar atual.

O gráfico abaixo ilustra o comportamento do valor de mercado da companhia desde janeiro de 2007. As retas escuras indicam a tendência das cotações em cada intervalo.

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Comparar desempenhos de investimentos em períodos de mandatos de governos é sempre arriscado. Diversos fatores, sem relação com o ambiente político, podem afetar o comportamento das aplicações.  Mas, em época eleitoral, é um passatempo inevitável.

O fato, então, é que durante o primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso o valor de mercado da Petrobras subiu 22%. No segundo mandato a alta foi de 400%. No primeiro período do presidente Lula o valor da companhia subiu 323% e, no segundo, a alta foi de 65%.

Com a presidente Dilma, a queda até agora é de 46%. Pode ser que o valor da empresa se recupere. Ou então, como gostava de dizer o presidente Lula, é possível que nunca antes na história deste país o valor de mercado da Petrobras tenha caído tanto durante um determinado mandato presidencial.

Para sair da crise, será preciso que a administração da companhia mostre empenho em atacar os problemas atuais.

Razões para especular com Petrobras

A estreia de um curioso padrão de comportamento para o mercado de ações brasileiro, que vincula o preço dos papéis da Petrobras à variação dos índices de popularidade do atual governo, estimulou o aumento dos negócios.

Em 27 de março foi divulgada pesquisa CNI/Ibope mostrando queda na aprovação da presidente Dilma. No fim do dia, a BM&FBovespa havia registrado o maior volume financeiro do ano: quase R$ 10 bilhões.

A dinâmica da nova estratégia de investimento que vem sendo seguida é simples. Quando as pesquisas mostram queda na avaliação do governo, o valor da estatal sobe. O oposto tende a acontecer se as novas pesquisas mostrarem crescimento do apoio às políticas atuais. O relevante desse procedimento é que os investidores passaram a adotar um padrão para balizar os negócios, o que termina incentivando as transações.

Uma das explicações para esse comportamento está nas teorias de J.M. Keynes. Artigo da jornalista Luciana Seabra, do Valor, e do economista David Dequech, da Unicamp, publicado na edição de outubro-dezembro de 2013 da Revista de Economia Política, descreve o mecanismo. O objetivo dos autores é analisar a alta taxa básica de juros praticada no Brasil. Porém, antes de desenvolverem os argumentos, resumem as ideias do pensador inglês.

Para Keynes, o método adotado pelos aplicadores para dar previsibilidade ao valor dos investimentos é, na realidade, uma convenção. São as práticas corriqueiras e que são aceitas sem maiores contestações.

Na impossibilidade de se prever com segurança o valor de um empreendimento no fim de um período longo, a premissa é que “a situação existente dos negócios continuará por tempo indefinido, a não ser que tenhamos razões concretas para esperar uma mudança”, segundo o próprio Keynes.

Significa que o valor futuro de uma empresa depende da forma de condução dos negócios nos dias atuais, a menos que algo extraordinário aconteça. Apesar da evidente simplificação da realidade, essa forma de pensar é adotada por grande parte dos participantes do mercado.

Além disso, mais importante do que estimar o valor justo da companhia, interessa identificar o que os outros pensam dela. É a receita segura para fazer apostas potencialmente certeiras.

A metáfora de Keynes é uma competição em que o vencedor deve acertar os concorrentes mais votados em um concurso de beleza. Mais relevante do que o gosto pessoal do jogador, é descobrir a média da opinião dos demais competidores sobre a aparência dos candidatos.

A habilidade de prever o comportamento das cotações dos ativos financeiros no curto prazo com base na avaliação do que pensam outros investidores pode render bons dividendos. Comprar na baixa e vender na alta é objetivo de todo aplicador.

Do ponto de vista estatístico, as chances de acertar ou errar as apostas são iguais. Mesmo assim, muitos se dedicam à tarefa. E a contrapartida é a instabilidade do preço dos ativos. Como consequência, as mudanças de humor no curto prazo acabam afetando o valor esperado para os empreendimentos no longo prazo, mesmo que nada de concreto efetivamente aconteça.

A intuição de Keynes foi posteriormente comprovada por estudos empíricos. Na década de 80, Robert Shiller, vencedor do prêmio Nobel de Economia em 2013, demonstrou que o valor dos lucros e dividendos das empresas, ajustado pelos juros, é muito mais estável do que a série histórica do preço das ações, sujeita a grandes oscilações.

Desde então, os modelos para estimar o comportamento dos preços dos ativos passaram a levar em conta as flutuações de curto prazo das cotações. No caso da Petrobras, a convenção atual é que a ingerência política do governo prejudica as decisões da companhia. E esse fator foi incorporado nas previsões.

Mesmo para o investidor mais conservador e descrente da sua habilidade de acertar o momento certo de entrar e sair das posições, o histórico recente da variação do preço das ações PN da Petrobras estimula a especulação. Após subir 151% entre novembro de 2008 e dezembro de 2009, as ações entraram em um zigue-zague.

Desde então, em cinco períodos os papéis subiram mais de 20%, do ponto mínimo até o topo. E em seis ocasiões caíram mais de 25%, do ponto máximo até o fundo. Os momentos de alta e de baixa tiveram duração em torno de dois a cinco meses. Tentar acertar os ciclos, conforme assinalados no gráfico, parece tentador.

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Keynes defendia que o Estado deveria adotar medidas de estímulo à economia em determinadas situações, com o objetivo de manter o ritmo de crescimento da capacidade produtiva. A especulação, para ele, era danosa para as decisões de investimento.

O atual governo parece ter exagerado no ativismo desenvolvimentista. Ao interferir demasiadamente, acabou criando um ambiente favorável à especulação, atrapalhando os investimentos.

Para os detentores de ações da Petrobras, seria financeiramente mais rentável se as incertezas estivessem restritas aos riscos operacionais da própria companhia. Agora, a alternativa parece ser montar posições para tentar aproveitar as oscilações, controlando o risco da aplicação.