Meta fiscal menor implica dívida maior

Um dos principais desafios do Brasil é ajustar o tamanho da dívida pública. A percepção é que o grau de endividamento atual do país é excessivamente elevado, o que gera, entre outros problemas, incertezas sobre a manutenção do grau de investimento concedido pelas agências internacionais de classificação de risco.

A ideia original da equipe econômica era ajustar as contas do governo com o objetivo de conseguir, pelo menos, um superávit fiscal suficientemente elevado para evitar o crescimento da dívida. Agora, com a revisão para baixo da meta fiscal, o propósito não será alcançado tão cedo.

A relação entre a dívida bruta do governo geral e o produto interno bruto (PIB) em maio de 2015 era de 62,5%. Para reduzir o indicador, seria preciso combinar o aumento do superávit primário com maior crescimento econômico e redução dos juros.

Entretanto, a necessidade de controlar a inflação forçou o Banco Central a elevar as taxas de juros. Isso provocou, como efeito colateral, o encarecimento do serviço da dívida pública.

Outra consequência do aumento da Selic foi tornar os financiamentos bancários mais escassos e onerosos, o que acabou aprofundando a recessão no país e fez desabar a arrecadação com impostos.

A alternativa para o governo seria ajustar o orçamento às novas condições econômicas, reduzindo despesas. No entanto, sem a possibilidade de reunir apoio político para justificar cortes de gastos, só restou à equipe econômica desistir da meta fiscal.

A consequência será o aumento da razão dívida pública e PIB. O gráfico abaixo relaciona superávit primário, no eixo horizontal, com a variação do estoque da dívida pública em períodos anuais. Cada ponto representa um ano desde 2007 até 2014 e os valores estão expressos como percentuais do PIB.

A reta inclinada indica a tendência da variação anual da dívida bruta de acordo com os diferentes patamares do superávit primário que foram registrados.

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O superávit primário foi maior do que 1,5% do PIB em sete dos últimos oito anos. No período total, a relação dívida/PIB recuou em relação ao ano anterior em quatro oportunidades e subiu em outras quatro.

O ano de 2010 contabilizou a maior queda da relação dívida/PIB, de -7,54 pontos percentuais. O superávit primário foi de 2,62% do PIB.

Já 2014 foi o ano de maior crescimento da relação dívida/PIB, com alta de 5,63 pontos percentuais. O déficit primário foi de -0,59% do PIB.

Com um superávit primário da ordem de 0,1% do PIB para 2015, conforme a nova estimativa da equipe econômica, a expectativa é de uma elevação da relação dívida/PIB em torno de 4 pontos percentuais, considerando a relação histórica. O aumento pode ser ainda maior caso a retração do PIB seja muito grande e o custo da dívida fique muito alto.

O ajuste do endividamento do setor público continuará sendo um ponto de vulnerabilidade para o equilíbrio da economia.

Com Levy, crescimento da dívida aumenta

Até agora o ministro da fazenda Joaquim Levy não tem sido bem sucedido na tarefa de promover um ajuste fiscal suficientemente amplo para reduzir o ritmo de crescimento da dívida pública – um dos principais pontos de vulnerabilidade da economia brasileira –, conforme apontou reportagem do Valor em 01/07/2015.

Nos 12 meses encerrados em dezembro de 2014, a taxa de elevação da dívida bruta do governo geral foi de 18,4%. Em maio, o indicador aumentou para 22,2%, o maior percentual da série histórica desde que a metodologia de 2008 foi adotada.

O gráfico abaixo ilustra a evolução do aumento da dívida bruta em períodos de 12 meses.

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A dívida líquida do governo geral, uma conta em que são deduzidos, principalmente, as disponibilidades do governo federal aplicadas no Banco Central (BC) e os créditos junto ao BNDES, registrou um controle pouco mais efetivo. A taxa de aumento caiu de 14,8% nos 12 meses encerrados em dezembro para 13,3% no mesmo período terminado em maio de 2015.

Apesar do resultado positivo, o gráfico abaixo mostra que a taxa de crescimento da dívida líquida ainda está próxima das máximas históricas.

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Por ora, o freio para o crescimento da dívida líquida permanece concentrado na acumulação de ativos do governo. O ritmo da elevação das disponibilidades no BC e do montante aplicado no BNDES, também considerando períodos de 12 meses, subiu de praticamente zero em dezembro de 2014 para 20% em maio de 2015, conforme representado no gráfico a seguir.

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Os números revelam a dificuldade do governo para implantar o ajuste fiscal. E é um sinal de alerta para a eficácia da condução da política econômica.

Dívida cara para o Tesouro e retorno negativo para o investidor

Em 2013, o custo médio da dívida pública mobiliária federal, bancado pelo Tesouro Nacional, foi de 10,76%. Já o investidor que comprou os títulos do governo teve rendimento negativo, de -1,42%.

Essa diferença demonstra que alguma coisa deu errado com a estratégia de gestão da dívida pública nos últimos tempos.

O custo do Tesouro é o rendimento pago pela remuneração dos papéis públicos federais. O ganho do investidor, por sua vez, é formado pela combinação entre o rendimento do título e o ganho ou perda de capital decorrente da valorização ou desvalorização dos ativos no mercado secundário.

Entre 2005 e 2011, as diferenças entre o custo do Tesouro e o retorno do investidor oscilavam em uma faixa relativamente estreita, conforme ilustra o gráfico abaixo.

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Em 2007, o pior ano para os investidores em termos de ganhos nominais, o retorno, medido pelo Índice do Mercado Aberto Geral, foi de 12,63%. O custo da dívida pública, de acordo com os relatórios do Tesouro Nacional, atingiu 12,88%. A diferença foi de -0,25 pontos percentuais.

Em 2005 os investidores tinham ganho 18,19% e o custo do Tesouro havia sido de 16,96%, uma diferença de 1,23 pontos percentuais. Até 2012, a maior diferença positiva tinha sido de 2,71 pontos percentuais, em 2006. A maior diferença negativa, de -0,87 pontos percentuais, tinha ocorrido em 2008.

Num cenário financeiro equilibrado, a diferença entre o custo de captação do Tesouro e retorno do investidor não é grande. As distorções recentes podem sinalizar problemas na condução da política de administração da dívida pública.

Para os investidores, é importante equilibrar a carteira e acompanhar as decisões das autoridaes encarregadas da gestão da dívida pública, para evitar futuros prejuízos.