Mesmo com opções, escolhas seguem difíceis para o investidor

A variação dos principais índices de referência do mercado financeiro brasileiro foi largamente positiva nos últimos 12 meses encerrados em janeiro de 2018.

A rentabilidade acumulada no período do Certificado de Depósitos Interfinanceiros (CDI) foi de 9,40%. O CDI tem uma estreita relação com a Selic, atualmente fixada em 6,75% ao ano.

Já o IMA Geral – indicador que mede o ganho de uma carteira diversificada de títulos públicos – subiu 12,79% em 12 meses. Boa parte do rendimento foi ocasionado pela valorização dos papéis devido à queda dos juros para as operações de longo prazo.

E o Ibovespa, principal referência para o desempenho das ações negociadas na bolsa brasileira, teve alta de 31,3% no período. A melhora da economia e a queda do custo de capital para as empresas foram os fatores que fundamentaram o bom desempenho das ações.

Nesse ambiente altamente positivo seria natural esperar que a rentabilidade geral dos fundos de investimento, especialmente os mais agressivos, superasse com alguma folga os indicadores de referência do mercado. No entanto, não foi isso que aconteceu.

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A avaliação de uma listagem de fundos das categorias multimercado e ações disponibilizados nas principais plataformas de distribuição realça a dificuldade dos aplicadores para encontrar boas alternativas de investimento quando as ofertas são muito extensas.

As plataformas de distribuição são estruturas administradas por bancos ou corretoras que buscam oferecer uma ampla variedade de opções para o investidor. Na teoria, a diversidade proporciona maiores ganhos.

Assumindo que os distribuidores selecionam os melhores produtos disponíveis no mercado, o esperado seria que, dentro deste universo, qualquer escolha que fosse feita pelo investidor teria boas chances de produzir bons resultados.

Uma forma para testar o argumento é verificar se a mediana da rentabilidade das carteiras oferecidas nas plataformas de distribuição foi superior aos índices de referência do mercado.

A mediana é um indicador que divide uma amostra em duas metades. No caso de uma lista de fundos, acima da mediana ficam a metade dos fundos com melhor desempenho. Abaixo da mediana, os fundos com pior rendimento.

A média de uma amostra, especialmente da rentabilidade de ativos financeiros, sempre pode ser influenciada por algumas poucas carteiras com desempenho muito positivo ou negativo. A mediana tende a minimizar o efeito de valores extremos.

Para entender o conceito, imagine que um investidor escolheu quatro fundos em uma plataforma de distribuição. Numa situação normal, o esperado é que o investidor aplique em dois fundos com rendimento acima da mediana e dois com rendimento abaixo.

Se nenhum desses quatro fundos hipotéticos tiver desempenho excepcional, para cima ou para baixo, a expectativa é que o investidor consiga rentabilidade próxima da mediana.

Listando todos os fundos das principais plataformas de distribuição e fazendo efetivamente todos os cálculos, é possível constatar que a mediana da rentabilidade dos fundos multimercado ficou acima do CDI, mas foi menor do que o IMA Geral. E a mediana da rentabilidade dos fundos de ações foi inferior ao Ibovespa.

Isso significa que são grandes as chances de um investidor aplicar numa carteira de fundos mais agressivos e terminar com rendimento menor do que uma alternativa mais conservadora e que busque apenas seguir determinado parâmetro de referência. Especialmente se o investidor fizer essa seleção por sua conta e risco, sem ajuda de uma assessoria mais especializada.

No extremo oposto, se o investidor ficar assustado com a quantidade de alternativas disponíveis e optar apenas pelas opções mais conservadoras, pode perder a chance de obter um relevante ganho adicional.

O interessante é que esse padrão ocorreu num período com uma certa tendência de alta dos mercados, apesar das turbulências devido a quedas abruptas provocadas por fatores que estavam fora do radar dos especialistas.

Os números parecem indicar que ter acesso a uma boa plataforma de distribuição de fundos e demais produtos financeiros é importante, mas não suficiente para ter bons rendimentos. É fundamental selecionar as opções disponíveis com critério.

Compra da XP evidencia padrões fiduciários e de adequação

Em várias transações comerciais, é perfeitamente aceitável que a remuneração do intermediário seja estabelecida na forma de uma comissão proporcional ao montante pago pelo comprador ao vendedor.

Um caso típico é o valor da corretagem nos negócios com imóveis. Ou a comissão recebida pelo vendedor de automóveis. Nesses casos, é raro haver questionamentos sobre eventuais conflitos de interesses.

Boa parte dos serviços financeiros envolve a intermediação entre partes interessadas em uma transação. Assim, o pagamento de comissões vinculadas ao montante negociado é frequente. A diferença é que, algumas vezes, isso ocorre de forma indireta.

Especificamente no segmento de fundos de investimento, a taxa de administração da carteira possui uma dupla finalidade. Serve para remunerar tanto a atividade de gestão dos ativos quanto o trabalho envolvido na distribuição de cotas e orientação aos clientes.

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Do ponto de vista pragmático, o investidor tem à disposição diversas formas de aplicação. Cada modalidade possui determinada característica de risco e retorno. Cabe ao profissional financeiro selecionar as alternativas e indicar as melhores opções ao cliente, dado um determinado objetivo de investimento e um horizonte de tempo.

Como consequência da estrutura de remuneração com base no valor da transação, a lógica do corretor de imóveis, do vendedor de automóveis e, muitas vezes, do distribuidor de produtos financeiros acaba sendo a mesma: é mais rentável negociar o produto mais caro do que o mais barato.

Existe um atenuante, no entanto. Como a regra de bolso estabelece que o preço é diretamente proporcional à qualidade, pode não haver conflito entre os interesses do vendedor e do cliente se o negócio envolver a alternativa mais cara. A justificativa é que, simplesmente, o cliente comprou o melhor produto.

Mas é preciso cautela. A regulamentação separa as atividades dos intermediários financeiros conforme dois padrões de atuação.

O padrão fiduciário é quando os agentes das instituições financeiras agem conforme os melhores interesses dos clientes. Já o padrão de adequação é quando os profissionais financeiros possuem uma base razoável para acreditar que a transação recomendada é adequada para o cliente.

No segmento de administração de recursos, o padrão fiduciário é adotado para as atividades que envolvem a gestão dos fundos de investimento. O padrão de adequação é usado para regulamentar os negócios de distribuição de produtos financeiros.

O padrão fiduciário estabelece controles rígidos para o que pode e o que não pode fazer parte da carteira de um fundo. Por exemplo, devem ser claramente estabelecidos os percentuais máximos de ativos emitidos por companhias privadas, a estratégia para utilização dos instrumentos negociados no mercados futuros, opções e demais derivativos ou o montante dos ativos negociados no exterior.

O padrão de adequação obriga a instituição financeira a fazer uma avaliação do perfil do investidor e manter uma classificação de todos os produtos oferecidos. A exigência é que os produtos vendidos ao investidor sejam coerentes com o perfil de risco aferido.

O mercado de fundos de investimento vem passando por transformações importantes. Basicamente, existem duas maneiras de fazer a administração de recursos. Uma chamada de gestão ativa e outra conhecida como gestão passiva.

Na gestão ativa, o objetivo é encontrar as alternativas que podem proporcionar os maiores retornos dado as expectativas para os cenários futuros. Na gestão passiva a meta é simplesmente indexar a carteira a um determinado indicador de mercado.

Uma tendência global aponta para a redução do montante de recursos administrados na forma de gestão ativa e o crescimento do volume financeiro dos fundos com gestão passiva. Isso porque a relação entre o retorno e o risco da gestão ativa não tem se mostrado favorável e o custo da gestão passiva é significativamente mais baixo.

Como consequência, a margem para pagamento de rebates de taxa de administração para remunerar a distribuição de fundos vem diminuindo. A expectativa, então, é que a cobrança direta pela assessoria financeira aumente.

A aquisição da XP pelo Itaú Unibanco reforça uma tendência de separação das atividades de produção e distribuição de produtos financeiros. Falta ainda, no mercado brasileiro, o crescimento de uma atividade de assessoria financeira independente.

O negócio de distribuição de produtos financeiros caminha para se transformar numa atividade com padrão fiduciário, na qual os interesses dos clientes serão claramente colocados como prioridade. Até lá, é prudente que o investidor mantenha a devida cautela com as recomendações de investimento dos distribuidores.

Robôs ampliarão o alcance da assessoria financeira

No passado, investir em títulos atrelados à variação da taxa dos certificados de depósitos interfinanceiros (CDI) era algo relativamente complexo e caro. Hoje, graças à robustez dos códigos de computação e à proliferação de programas e aplicativos, basta um clique para que o negócio seja concretizado praticamente sem custos.

A edição de fevereiro e março da revista da Morningstar, uma provedora de serviços de informações sobre investimentos, discutiu o crescimento da utilização dos robôs no segmento de assessoria financeira.

Tradicionalmente, o objetivo da tecnologia no mercado de investimentos tem sido o de ampliar e tornar mais eficiente o processo de distribuição de produtos e serviços. Com o desenvolvimento da informática, em vez de depender de um profissional da linha de frente, o cliente passou a realizar suas operações diretamente por intermédio do computador, celular ou caixa eletrônico.

Isso ampliou a quantidade de transações executadas e proporcionou ganhos de escala às instituições financeiras. Parte do aumento da produtividade foi revertida para os clientes, por meio de custos mais baixos ou relatórios mais elaborados.

O passo seguinte foi o de aumentar o leque de informações sobre as alternativas de investimento disponíveis. Como consequência, diversos sites na internet passaram a oferecer ferramentas onde é possível selecionar ativos, comparar opções e simular resultados, além de realizar as aplicações.

A tendência mais recente é que robôs façam sugestões de alocação de recursos com base nas informações fornecidas pelo investidor sobre os objetivos da aplicação e da tolerância aos riscos de perda do capital. A partir daí o cliente pode decidir investir na carteira sugerida, que é reajustada periodicamente de maneira automática conforme mudem as condições de mercado.

Os modelos de construção de carteiras envolvem estimar o maior retorno possível para um determinado nível de risco. O gráfico abaixo indica a relação entre o ganho acumulado e a oscilação da rentabilidade desde janeiro de 2015 até abril de 2016 para os principais indicadores do mercado financeiro brasileiro.

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A ideia é combinar os ativos de tal maneira a conseguir as ponderações mais eficientes, tendo em vista os objetivos que foram estipulados. O processo de assessoria financeira busca estabelecer parâmetros conforme as necessidades específicas de cada cliente.

Como em qualquer modelo, para tirar o máximo de proveito é preciso entender a lógica das premissas. Segundo os especialistas, existe um ciclo de aprendizagem.

Em um primeiro momento, nossa preferência é conversar com uma pessoa que possa nos explicar em detalhes as estratégias de investimento sugeridas. Depois, conforme vamos nos aprofundando a respeito do assunto, a tendência é ganharmos confiança para tomar decisões autônomas e executá-las via Internet.

Para Don Phillips, diretor executivo da Morningstar, a qualidade da assessoria financeira está em alta. Paradoxalmente existem hoje nos Estados Unidos menos assessores financeiros em relação ao que havia no passado. Entretanto, a demanda por serviços mais elaborados aumentou.

A tecnologia permite que os assessores financeiros adotem um tratamento mais amplo, o que no jargão de mercado é chamado de abordagem holística. Trata-se de um conceito teórico segundo o qual a totalidade dos fatores interagem, formando um todo que não pode ser entendido isoladamente.

No caso específico da assessoria financeira, para definir a composição mais eficiente da carteira é necessário conhecer em detalhes todas as necessidades do cliente. Muitas vezes, apenas com uma conversa pessoal é possível identificar os parâmetros relevantes para um planejamento abrangente.

A consequência prática da evolução tecnológica é uma mudança na forma de remuneração do trabalho dos prestadores de serviço. Em vez de as comissões estarem relacionadas com o valor do patrimônio dos investidores, cada vez mais o ganho dos assessores financeiros estará fundamentado no valor que o profissional puder agregar para seus clientes.

Os robôs estão se tornando uma plataforma importante para os assessores financeiros. Como a tecnologia ajuda a economizar tempo e aumentar a escala de prestação de serviços, torna-se possível atender mais clientes.

Fazendo uma analogia com o Uber, que estimulou o setor de serviços de transporte em carros particulares, graças aos robôs é possível imaginar uma expansão significativa do mercado de assessoria de investimentos.