Padrões de avaliação de informações influenciam decisões de investimento

Qualquer investidor que já tenha se deparado com um prospecto de emissão de um título ou valor mobiliário ficou com pelo menos duas impressões iniciais.

A primeira foi positiva, dado o grau detalhamento sobre as operações da companhia. A segunda foi negativa, devido ao desafio de encarar a enorme quantidade de informações disponíveis.

Tanto empresas que buscam captar recursos para financiar suas atividades quanto reguladores que fiscalizam as operações no mercado de capitais possuem um objetivo comum. É preciso transmitir informações relevantes para que o investidor tome a decisão de investimento da forma mais embasada possível.

No entanto, existem controvérsias sobre a melhor forma de atingir essa meta.

Do ponto de vista da racionalidade econômica, é melhor ter mais informações do que menos. Isso porque, no fim, tudo ganha o devido peso e acaba incorporado ao preço de mercado do ativo.

Mas a percepção é de que o excesso de informação é contraproducente. Um exemplo emblemático é a seção de riscos de alguns prospectos, em que os pontos elencados chegam a ser risíveis.

Existem explicações psicológicas para o sentimento de desconforto que surge quando nos deparamos com o exagero de dados. Como a atenção é um recurso escasso, não é fácil distinguir entre as informações que são relevantes e as que podem ser descartadas.

Para aprofundar o tema, a pesquisadora Bianca Checon uniu psicologia e contabilidade na tese “Atenção limitada, o uso da informação contábil e seus impactos na tomada de decisão de investimento individual”. O trabalho foi feito para conclusão do curso de doutorado no departamento de contabilidade e atuária da Faculdade de Economia, Administração e Atuária da USP.

Uma das contribuições originais da tese foi buscar identificar quais os padrões de informações contábeis e não contábeis que os investidores brasileiros se apoiam para embasar suas escolhas.

O estudo avaliou o processo de decisão de um conjunto de investidores profissionais e individuais. A técnica utilizada, chamada metodologia Q, procura medir os aspectos subjetivos que influenciam os investidores a levar em conta certas informações em detrimento de outras.

Em entrevistas, a pesquisadora pediu para que os investidores ordenassem, por grau de relevância, 62 itens relacionados a oito grupos de informações.

Os itens foram reunidos por notícias das companhias, fatos relevantes divulgados pelas empresas, dados históricos das ações, informações macroeconômicas, informações contábeis, indicadores contábeis, informações de terceiros e banco de dados de informações.

A premissa da metodologia é que os processos de decisão individuais estudados a partir de uma amostra acabam formando alguns conjuntos significativos com características comuns. A identificação desses padrões é feita estatisticamente e as conclusões podem ser generalizadas.

Para o grupo formado por investidores profissionais (IPs), os resultados indicaram que as decisões são tomadas de uma maneira estratégica. E que os itens avaliados são coerentes e alinhados com a abordagem escolhida.

De uma forma geral, os IPs começam por uma avaliação qualitativa da empresa ou do ambiente de negócios. Depois aprofundam o entendimento analisando aspectos quantitativos. Finalmente, buscam corroborar as conclusões com fontes externas. A pesquisa detectou três abordagens principais.

Na primeira, que poderia ser chamada de “conhecendo a companhia a partir das informações divulgadas”, o passo inicial é entender o modelo de negócios da empresa. Em seguida são avaliadas informações do setor de atuação. E, finalmente, são estudados os indicadores de liquidez das ações e desempenho operacional.

A segunda abordagem tem início na avaliação geral e vai para o particular. A estratégia é começar com o estudo de indicadores macroeconômicos e dados sobre o negócio e o desempenho passado da companhia avaliada. Depois, identificada a oportunidade de investimento, são feitas as demais análises mais aprofundadas da companhia.

A terceira forma adotada pelos IPs pode ser caracterizada como uma combinação das duas primeiras.

A abordagem dos investidores individuais (IIs) difere significativamente da dos profissionais. Para esse grupo foram detectadas quatro maneiras para avaliar as informações.

Em todas os estudos estatísticos indicaram que são considerados um excesso de itens com informações parecidas. Isso indica que os IIs perdem tempo avaliando dados semelhantes.

Outro aspecto relevante é que não existe um consenso entre as abordagens adotadas pelos IIs. Com dificuldades para administrar o excesso de informações, o resultado é que a avaliação de dados quantitativos antecede as análises qualitativas.

Como a abordagem dos IIs é significativamente diferente das dos IPs, a percepção do estudo é que isso leva a resultados piores no longo prazo. Mas esse fato não foi testado.

Do ponto de vista pragmático, o trabalho sugere que os investidores individuais estariam mais bem atendidos caso delegassem seus investimentos para investidores profissionais, mesmo que essa decisão implicasse algum tipo de custo adicional.

Além da possibilidade de atingir uma melhor relação entre risco e retorno, reduziria a complexidade da gestão dos investimentos.

Condicionamento operante para investir no Ibovespa

Mesmo com a crise política, sinais ainda frágeis de recuperação econômica e lucro por ação das companhias abertas abaixo da média histórica, o Ibovespa atingiu o recorde de 76 mil pontos no pregão do dia 18 de setembro.

A aposta predominante é que a queda dos juros, a condução austera da política econômica e a falta de um substituto para viabilizar o possível afastamento do presidente Temer para que as denúncias oferecidas pela Procuradoria Geral da República sejam apuradas levarão a uma transição com relativamente poucos solavancos até a posse do novo governo em 2019.

No ambiente externo, o consenso é que a estabilidade da inflação em patamares muito baixos, mesmo com todo o aumento da oferta monetária promovida pelos bancos centrais dos países desenvolvidos, continuará postergando a alta das taxas de juros pelo mundo. E a ameaça nuclear da Coreia do Norte ainda é vista com certo desdém.

Neste cenário menos racional e mais emocional, os aspectos psicológicos ganham importância para explicar o rumo dos investimentos no mercado financeiro. O risco, em contrapartida, é surgir um certo condicionamento para aceitar que a alta das bolsas e demais ativos de risco seria um fenômeno natural e inevitável.

Um dos campos da economia comportamental é o estudo de como os estímulos influenciam nossas atitudes. Esse tipo de análise é usado, principalmente, para identificar e tentar prever o comportamento do consumidor.

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A ideia é que para um determinado estímulo, existirá uma resposta que poderá ser reforçada por um outro estímulo. Isso ocorre de forma planejada com o objetivo de, por exemplo, aumentar a eficácia das vendas.

O pesquisador Gordon R. Foxall desenvolveu um arcabouço teórico que chamou de modelo de perspectiva comportamental, BPM na sigla em inglês. A base da argumentação é que é possível influenciar o comportamento do consumidor por meio do desenvolvimento de diversas relações que, na psicologia, se chama de condicionamento operante.

Resumidamente, a teoria descreve que por meio de uma combinação de estímulos chamados de reforços e punições, positivos e negativos, é possível moldar um determinado comportamento.

Para entender o conceito, imagine que o objetivo de uma determinada ação seja fazer com que as pessoas dirijam de maneira segura. O reforço positivo é a recompensa que a pessoa recebe se agir conforme o objetivo proposto.

Nesse exemplo, a economia de combustível que será conseguida se o motorista respeitar as velocidades sugeridas será um reforço positivo. É um ganho financeiro palpável.

Já o reforço negativo é a eliminação de algo desagradável caso a atitude correta seja tomada. No exemplo isso ocorre quando o motorista afivela o cinto de segurança e o som desagradável do apito disparado pelo sistema de segurança do veículo é eliminado.

A punição positiva é quando uma multa é aplicada por excesso de velocidade. E a punição negativa acontece quando a carteira de motorista é cassada após uma série de infrações graves e a pessoa fica proibida de dirigir.

A partir da aplicação destes conceitos, os especialistas em economia comportamental desenvolveram uma série de análises para definir modelos de comportamento. Muitas delas podem ser aplicadas ao mercado financeiro.

A recente alta do Ibovespa, de quase 100% desde 31 de janeiro de 2016 pode ser encarada como um reforço positivo. A rentabilidade passada das aplicações tem um forte poder de atração de novos recursos e de alimentar novas altas do mercado.

Um exemplo de reforço negativo é o fim da restrição para aplicação em um fundo rentável. Isso ocorre principalmente nos fundos multimercados, quando carteiras que estavam fechadas para aplicações reabrem ou quando produtos antes restritos a clientes institucionais passam a ser oferecidos nas plataformas de varejo dos distribuidores.

O investidor que sacou recursos da bolsa nos momentos de baixa do mercado tende a encarar a alta recente como uma punição positiva, já que amargou uma perda que poderia ter evitado.

E quando o Banco Central reduz a taxa Selic, a queda da remuneração das aplicações indexadas aos juros de curto prazo (CDI ou Selic) pode ser vista como uma punição negativa. O investidor deixa de ter a possibilidade de obter ganhos elevados e com baixo risco.

Nesse atual ambiente de incertezas, é prudente tomar cuidados extras e delegar parte da gestão dos recursos a um administrador profissional. Tentar acertar os altos e baixos do mercado parece excessivamente arriscado.