Rumo à privatização da aposentadoria

As regras propostas para a reforma da previdência realçam a necessidade de poupar ao longo da vida ativa para complementar o valor da aposentadoria no futuro. Conforme o projeto em discussão, para ter direito à aposentadoria integral igual ao valor do salário da ativa, o trabalhador que recebe rendimentos de até R$ 5.190 – o teto do INSS – teria que começar a trabalhar aos 25 anos, contribuir por 49 anos e se aposentar aos 74 anos. É uma hipótese irrealista.

Considerando um cenário otimista, se o contrato de trabalho começasse aos 25 anos e o trabalhador decidisse se aposentar aos 65 anos após contribuir por 40 anos, o valor do benefício seria equivalente a 91% do salário. E numa simulação mais realista, caso a contribuição seja de 35 anos, dos 30 até os 65 anos de idade, o montante da aposentadoria seria igual a 86% do salário.

Isso assumindo, para simplificar a análise, que o rendimento do trabalhador será constante desde o começo da vida ativa até a aposentadoria. Quanto mais o salário for subindo ao longo do tempo, maior a defasagem entre o valor da aposentadoria – calculado a partir da média das contribuições – e da última remuneração.

A conclusão é que para conseguir rendimento integral na aposentadoria, o trabalhador terá que se preocupar em poupar parte do salário em aplicações financeiras ou estruturas de previdência complementar. Assumindo expectativa de vida de 85 anos, a diferença entre o valor da aposentadoria do INSS e o rendimento almejado terá que ser coberto por saques desses investimentos.

No cenário otimista, o valor da poupança acumulada aos 65 anos deveria ser de R$ 320 mil para cobrir a diferença de 9% entre o salário hipotético de R$ 5.190 e o valor da aposentadoria. No caso realista, a poupança teria que ser de R$ 375 mil.

Assumindo que o trabalhador economize mensalmente parte do salário para acumular recursos para o futuro, no cenário otimista ele precisaria guardar o equivalente a 5,2% dos rendimentos para atingir seu objetivo. No cenário realista, o esforço de poupança mensal seria de 7,4% do salário. Para os casos de salários acima do teto do INSS, a necessidade de poupança é maior.

A premissa para os cálculos é de rendimento dos investimentos de 2% ao ano real, acima da inflação, tanto no período de acumulação quanto no de desembolso. Isso acaba revelando outro complicador.

O trabalhador interessado em poupar periodicamente para complementar a aposentadoria precisa contornar o fato de que, para valores de aplicação pequenos, as taxas cobradas nos produtos financeiros são elevadas.

Nos planos de previdência, por exemplo, é comum comissão de carregamento de 3% sobre as contribuições e de taxa de administração de 3% ao ano sobre o montante investido. Com esses custos, é difícil atingir o objetivo de rentabilidade de 2% ao ano acima da inflação, conforme usado nas simulações.

Assim, além da reforma macroeconômica da previdência, seria importante o governo avaliar os ajustes microeconômicos que poderiam ser feitos para tornar um pouco menos difícil a vida do trabalhador.

Regras INSS        
         
Teto do INSS 5.190      
período mínimo de contribuição (anos) 25      
% do teto INSS com período mínimo de contribuição 76%      
Adicional do % do teto por ano adicional de contribuição 1%      
Idade mínima de aposentadoria 65      
         
                                        Cenários
Premissas Irrealista Otimista Realista Pessimista
Idade de início da contribuição 25 25 30 25
Idade após período mínimo de contribuição 50 50 55 50
Idade de término do contrato de trabalho 74 65 65 60
Idade da aposentadoria 74 65 65 65
Contribuição adicional (anos) 24 15 10 5
Período total de contribuição (anos) 49 40 35 30
% teto com período total de contribuição 100% 91% 86% 81%
Expectativa de vida (anos) 85 85 85 85
         
                                       Cenários
Simulação Irrealista Otimista Realista Pessimista
Poupança para garantir a renda desde o término do contrato de trabalho até a idade mínima para aposentadoria 0 0 0 318.006
Poupança para garantir o complemento integral da aposentadoria do INSS 0 99.287 154.447 209.607
Valor total da poupança 0 99.287 154.447 527.613
Necessidade de poupança mensal em relação ao salário ao longo do período de atividade 0,0% 2,4% 4,6% 15,6%

 

Situação específica para ganhos acima do teto do INSS        
Salário 10.380 100% acima do teto do INSS
Renda mensal almejada na aposentadoria 8.304 80% do salário da ativa
Renda suplementar acima do terto do INSS 3.114      
         
         
                                    Cenários
Premissas Irrealista Otimista Realista Pessimista
Idade de início da contribuição 25 25 30 30
Idade após período mínimo de contribuição 50 50 55 55
Idade de término do contrato de trabalho 74 65 65 60
Idade da aposentadoria 74 65 65 65
Contribuição adicional (anos) 24 15 10 5
Período total de contribuição (anos) 49 40 35 30
% teto com período total de contribuição 100% 91% 86% 81%
Expectativa de vida (anos) 85 85 85 85
         
         
         
                                  Resultados
Simulação Irrealista Otimista Realista Pessimista
Poupança para garantir a renda desde o término do contrato de trabalho até a idade mínima para aposentadoria 0 0 0 508.810
Poupança para garantir o complemento integral da aposentadoria do INSS 0 99.287 154.447 209.607
Poupança para garantir o suplemento da aposentadoria do INSS 396.177 661.916 661.916 661.916
Valor total da poupança 396.177 761.203 816.363 1.380.332
Necessidade de poupança mensal em relação ao salário ao longo do período de atividade 3,6% 9,3% 12,1% 25,2%

4 pensamentos sobre “Rumo à privatização da aposentadoria

  1. Para mim o correto, corretíssimo, seria cada pessoa fazer sua própria previdência desde que começa a trabalhar. Esse modelo é vigente em alguns países. Algumas medidas de cunho social, despidas de moralismos religiosos imbecis, seriam de ótimo efeito a longo prazo. Não é justo termos que pagar pela previdência alheia.

    • Filha, a sua aposentadoria vai ser paga pelos outros. Ademais, o regime de capitalização, que é o nome do que você está propondo, cristaliza e eterniza as desigualdades já exageradas da nossa sociedade. E lembro que o capitalismo precisa de consumidores.

    • Concordo com a Camila. A aposentadoria dela será paga or ela mesma, pelo que poupou e investiu. Sem depender nem prejudicar os outros.

    • A sua aposentadoria será paga por você mesma, por ter poupado e investido, sem depender nem prejudicar terceiros. Parabéns!

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