As mudanças para o próximo governo

Apesar das idas e vindas da política econômica, os quatro anos do primeiro mandato da presidente Dilma prometem terminar com desvalorização cambial e juros acumulados na casa de 10% ao ano. Além disso, a inflação média caminha para fechar no nível de 6% ao ano.

Foi uma mudança significativa em relação ao padrão dos últimos governos, dos presidentes Lula e FHC.

Em termos anualizados, de 1995 a 1998 e de 2003 a 2010, as aplicações em reais renderam, no mínimo, 15 pontos percentuais a mais que os investimentos em dólares. A inflação ficou acima da desvalorização cambial em três dos últimos quatro mandatos presidenciais. A exceção foi o conturbado período entre 1999 e 2002.

No atual governo, tanto as aplicações em dólares quanto as vinculadas aos títulos públicos de longo prazo proporcionaram bons lucros, apesar das oscilações frequentes. Na bolsa, os índices mais amplos, como o Ibovespa, mostraram resultados desapontadores. Mas, algumas carteiras setoriais, vinculadas às empresas dos setores de consumo e financeiro, registraram ganhos expressivos. A escolha correta dos papéis, portanto, fez diferença para a rentabilidade total no período.

Na teoria, os indicadores econômicos do governo Dilma revelariam um ambiente positivo para os negócios. Com o real mais fraco, produtos fabricados no Brasil tenderiam a ficar mais competitivos no mercado global. Consequentemente, as vendas potenciais para o exterior poderiam justificar a expansão das atividades locais. Isso, por sua vez, estimularia uma nova rodada de investimentos das empresas para ampliar a capacidade produtiva.

Seria o mundo ideal, que combinaria aumento da produção, crescimento do emprego e maior consumo interno, ajudado pelos juros mais baixos. Mas nem tudo saiu conforme o esperado.

Foram três principais problemas enfrentados ao longo dos últimos quatro anos. O principal foi o ressurgimento da inflação, que ficou consistentemente acima do centro da meta e provocou questionamentos recorrentes sobre a necessidade de eventuais ajustes na taxa básica de juros.

Depois, as frequentes intervenções governamentais no ordenamento da economia aumentaram as incertezas e afetaram a programação dos investimentos privados. Finalmente, a percepção de um excesso de manobras para justificar o equilíbrio das contas públicas minou a credibilidade da meta de superávit fiscal.

Avaliando retrospectivamente os resultados alcançados, o consenso é que a política econômica atual, qualquer que seja o presidente, deverá mudar. Nesse ambiente de grandes incertezas e acirrada disputa, é difícil fazer prognósticos.

O pano de fundo é o risco de uma eventual alta da inflação nos EUA. Isso levaria o Fed a elevar os juros. As consequências seriam a deterioração das condições gerais de financiamento global e possível queda do preço dos ativos financeiros mundiais.

É consenso que os juros americanos estão em nível muito baixo e tendem a subir. Mas, dadas as possíveis consequências para a estabilidade financeira mundial, a perspectiva é de que o Fed só decida elevar os juros quando for realmente necessário, a fim de diluir o custo dos ajustes no tempo.

O Brasil seria menos afetado pelo ajuste externo se mantivesse a atual avaliação das agências classificação de risco. O país é considerado como “investment grade”. Simplificadamente, significa que os papéis brasileiros emitidos no exterior são alternativas aceitáveis para investidores mais conservadores.

Para manter a nota das agências de risco, o país é obrigado a adotar uma política econômica razoavelmente equilibrada. O acúmulo de práticas que poderiam levar a uma desestabilização mais grave da economia brasileira resultaria em queda da nota. E não será do interesse do próximo governo ter a classificação rebaixada.

Existem diversos índices no mercado global que medem o desempenho dos variados segmentos do mercado financeiro, inclusive segundo o nível de risco. O Barclays Capital mantém um série de indicadores para o mercado de renda fixa.

Os papéis brasileiros emitidos no exterior são acompanhados pelo índice “Barclays EM USD Agg Brazil”. Os títulos americanos emitidos por empresas consideradas de alto risco, abaixo do “investment grade”, são medidos pelo “Barclays US Corporate High Yield”. E os papéis americanos de baixo risco e prazo médio de vencimento de entre cinco a sete anos são refletidos no indicador “Barclays US Agg 5-7 Yr”.

A evolução da série histórica dos rendimentos (“yield”) dos indicadores desde janeiro de 2012 está listada no gráfico abaixo. A partir do terceiro trimestre de 2013, o rendimento dos títulos brasileiros ficou mais próximo dos papéis americanos de alto risco. Mais recentemente houve novo distanciamento, voltando a se aproximar dos títulos de baixo risco.

Barclays

Nesse ambiente de turbulências, uma premissa razoável é que o futuro governo brasileiro irá trabalhar para evitar perder o grau de investimento. Se a nova política econômica for bem sucedida e alcançar esse objetivo, as oscilações do preço dos ativos locais podem ser fortes, mas não terão efeitos catastróficos para a carteira dos investidores. Ainda não há motivos para pânico.

11 pensamentos sobre “As mudanças para o próximo governo

  1. Não entendi bem. Se a política econômica conseguir manter o investment grade poderemos ter oscilações fortes no preço dos ativos? E se perdermos o investment grade então?

  2. Em algum momento o Fed vai aumentar os juros, o que vai aumentar a instabilidade dos mercados financeiros mundiais, incluindo o Brasil. Se o Brasil também perder o grau de investimento, aí as oscilações serão muito grandes e a situação vai ser crítica.

  3. Muito bom o post.
    Existe alguma regra ou parâmetro que indique a relação do rating de um País (ou mesmo de uma empresa) com o spread que seria justo para um ativo “livre de risco”, como um título soberano com rating AAA (ou, no caso de empresas, para o rating soberando do país da empresa)?
    Grato

  4. Obrigada pela resposta. Mas, poderia ser mais específico ou sugerir algum artigo? (ou então, fica aí uma sugestão para um futuro post 😉

    • Vou pensar num outro post. A abordagem para avaliar o impacto do risco de crédito no valor de uma carteira de ativos você encontra em John C. Hull, Risk Management and Financial Institutions.

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